#Tenorio50: brota na Vila Matilde a semente de um futuro campeão

#Tenorio50: brota na Vila Matilde a semente de um futuro campeão

por Comunicação CBDV — publicado 2020/10/19 00:00:00 GMT-3, Última modificação 2020-10-19T00:00:00-03:00
Numa época de quase anonimato do judô paralímpico, o destino uniu um sensei engajado a um jovem talento

Por Comunicação CBDV
19/10/2020
São Paulo/SP

Antônio Tenório talvez não saiba disso, mas o início de sua trajetória vitoriosa no judô paralímpico tem um nome fundamental: Alessandro. Não se trata de professor, familiar ou atleta que tenha inspirado o garoto que, aos 19 anos, perdeu a visão do olho direito por infecção tempos depois de uma semente de mamona lhe ter tirado a visão do esquerdo. Alessandro, na verdade, era uma criança de 12 anos cuja mãe foi à procura do sensei Fernando da Cruz na Zona Leste de São Paulo.

"Ela veio me procurar dizendo que o filho queria praticar judô, só que ele era deficiente visual. Falei: 'Me traz o garoto depois da aula, que eu falo com ele'. O Alessandro tinha perdido a visão aos quatro anos por glaucoma. Comecei a fazer aula com movimentos, falando, explicando. Mas eu não tinha muita noção de como fazer aquilo", conta Fernando, um ex-atleta faixa preta campeão de torneios tradicionais, como os Jogos Abertos do Interior, e que resolveu passar adiante os conhecimentos na modalidade.

Alessandro foi levado para o dojô da Vila Matilde, bairro tradicional da capital paulista, onde o sensei já ensinava judocas videntes. De cara, um problema: o garoto mas era muito maior do que os demais alunos. Fora isso, metodologia de treinos para deficientes visuais também carecia de informações. Afinal, estamos falando aqui de meados dos anos 80, quando a modalidade sequer havia estreado nos Jogos Paralímpicos – a primeira edição com o judô na grade aconteceria em 1988, em Seul, na Coreia do Sul.

"Soube do Instituto Benjamin Constant, no Rio, que tinha judô para deficientes. Entrei em contato com o diretor, Carmelino, e o professor Osmar. Fui lá para conversar com eles e aprender. Percebi que o judô paralímpico era igual o tradicional, só precisava criar uma metodologia para ensinar o deficiente visual", relata o professor. "O B2 (atleta com percepção de vultos) e B3 (consegue definir imagens) era mais simples, porque eles conseguiam olhar e repetir o que fazíamos no treinamento. No B1 (cegos totais ou com percepção de luz, mas sem reconhecer formatos), a metodologia era a prática. Eu ensinava o movimento e o nome, e o judoca decorava para saber o que fazer quando eu pedisse."

Aos poucos, a história de que havia um local em São Paulo para judocas cegos praticarem a modalidade circulou e atraiu atletas de outras partes do Brasil. "Começou com quatro alunos. Antes do Tenório chegar, já tinha uns dez", diz o sensei.

“Ouvi falar de um professor...”

Em 1993, Fernando da Cruz levou alguns alunos videntes para disputar um Campeonato Paulista no interior de São Paulo. Chegando à área de competição, presenciou uma discussão entre a organização do evento e um judoca. Era Antônio Tenório. "Eu já havia escutado sobre ele, que era um faixa marrom bom de judô. Não queriam deixá-lo disputar alegando que ele era deficiente físico. Fui intervir, eu já era coordenador técnico da antiga ABDC (Associação Brasileira de Desportos para Cegos, o equivalente a CBDV na época). Acabaram liberando ele para lutar."

Nas palavras do sensei, porém, o que se viu nas lutas do deficiente visual contra os judocas convencionais foi um certo jeitinho da arbitragem para tirar logo Tenório de cena. "Ele caiu meio de lado, e o árbitro já deu ippon", conta Fernando, que se aproximou do judoca após a luta para conversar com o atleta. "Ele perguntou se tinha sido ippon, falei que não, que queriam logo se livrar dele. Então, o Tenório disse que tinha ouvido falar de um professor na Vila Matilde. Eu disse: 'Você está falando com ele'. Foi ali que tudo começou."

Forte e extremamente focado, Tenório não demorou a chamar a atenção. Nos primeiros campeonatos internacionais pela América do Sul, medalhas. O primeiro Mundial, em 1995, em Colorado Springs, valia vaga para Atlanta 1996. "Formei uma equipe com sete atletas e levei o pessoal para os Estados Unidos. Foi feito o sorteio e, na chave do Tenório, havia atletas muito bons", relata Fernando, já na condição de técnico da Seleção Brasileira – o Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB) surgiria naquele mesmo ano.

Após cair na semifinal, o brasileiro passou pela repescagem e garantiu não só um bronze, como um lugar na delegação que iria para os Jogos Paralímpicos, no ano seguinte. Mas isto já é outra história...

#Acessibilidade: foto da delegação brasileira no aeroporto embarcando rumo a Colorado Springs, em 1995. Tenório está de pé, com óculos escuros. O professor Fernando é o segundo agachado, da esquerda para a direita.

Semana #Tenorio50

Antônio Tenório da Silva, o maior judoca paralímpico de todos os tempos, vai completar 50 anos de vida no próximo sábado (24). A partir desta segunda e até o dia do aniversário do atleta, serão publicadas reportagens relembrando a sua carreira, uma edição especial do "CBDV Ao Vivo" – programa de entrevistas realizado nas nossas redes sociais – com o aniversariante na quinta (22), às 15h, em nosso Instagram (@cbdvoficial) além da exibição do filme "B1 - Tenório em Pequim", que narra a trajetória do ouro em 2008, totalmente gratuita na nossa página no Facebook.


Comunicação CBDV

Renan Cacioli

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